O Ministério do Trabalho e Emprego publicou a Portaria MTE/3.714/2023, em 27.11.2023, cuja vigência a partir de 01.12.2023, sendo que esta nova normativa, em conjunto com o Decreto Federal nº 11.795/2023, de 23.11.2023, estabelece a regulamentação da Lei Federal n. 14.611/2023, que dispõe sobre a igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens no País.
O citado Decreto Federal nº 11.795/2023, de 23.11.2023, estabelece os mecanismos de transparência salarial e critérios remuneratórios, dispondo sobre o Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios e o Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Mulheres e Homens (para casos em que for apurada a discriminação salarial), e, ainda, o Decreto estabeleceu as regras, dados e procedimentos que devem ser seguidos pelas empresas com mais de cem empregados, em atenção ao disposto no art. 5º da Lei 14.611/2023, para que as ditas firmas realizem publicação semestral de relatórios de transparência salarial e de critérios remuneratórios, observada a proteção de dados pessoais de que trata a Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais).
Já a Portaria 3.714/2023, dispõe, de forma mais detalhada, sobre a responsabilidade do Poder Público pela elaboração do relatório de transparência salarial e de critérios remuneratórios, seu conteúdo e forma de divulgação, e estabeleceu os procedimentos administrativos para a atuação do Ministério do Trabalho e Emprego em relação aos instrumentos que viabilizarão a aplicação da Lei, entretanto, ainda não foi estabelecido todo o protocolo de fiscalização e, tampouco, as penalidades que serão aplicadas. Quanto ao relatório de transparência salarial, este decorrerá de dados informados pelos empregadores no eSocial, tais como os dados cadastrais do empregador e empregado, o número total de empregado por estabelecimento com a identificação dos cargos ou ocupações do empregador contidos na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), e, por fim, o número total de empregados por sexo, raça e etnia, com os respectivos valores do salário contratual e do valor da remuneração mensal, a qual deverá ser considerada com base nestes informes: salário contratual; décimo terceiro salário; gratificações; Comissões; horas extras; adicionais (noturno, de insalubridade, de penosidade, de periculosidade, dentre outros); terço de férias; aviso prévio trabalhado; descanso semanal remunerado; gorjetas; e, ainda, demais parcelas que façam parte da remuneração, por força de lei ou de norma coletiva de trabalho.
Ainda, a Portaria 3.714/2023 prevê a criação de uma aba eletrônica no “Portal Emprega Brasil” (plataforma do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE, que otimiza o atendimento à população dos serviços e políticas públicas de emprego), sendo que este novo instrumento, denominada “aba de igualdade salarial e de critérios remuneratórios” ainda será criada para coletar as seguintes informações complementares, a serem disponibilizadas pelas empresas, sobre: existência ou inexistência de quadro de carreira e plano de cargos e salários; os critérios remuneratórios para acesso e progressão ou ascensão dos empregados; a existência de incentivo à contratação de mulheres; a identificação de critérios adotados pelo empregador para promoção a cargos de chefia, de gerência e de direção; a existência de iniciativas ou de programas, do empregador, que apoiem o compartilhamento de obrigações familiares. Nesta nova Portaria, há a previsão para que os empregadores sujeitos à mesma, prestem eventuais informações complementares, nos meses de fevereiro e agosto de cada ano, relativamente aos dados que servirão para a aba indicada, bem como para o Poder Público faça a divulgação destes dados nos meses de março e setembro de cada ano, por meio de publicação, do relatório de transparência na plataforma do Programa de Disseminação das Estatísticas do Trabalho. Ainda, consta também a regra de que relatório de transparência deverá ser divulgado nos sítios eletrônicos das empresas, nas redes sociais ou por meio de outros canais que garantam sua ampla divulgação, para os empregados, para os trabalhadores e para o público em geral (art. 4º, da Portaria MTE/3.714/2023).
Também, a Portaria em comento também estabeleceu regras pragmáticas envolvendo a obrigação do empregador de elaborar, no prazo de 90 (noventa) dias da sua notificação pela Fiscalização do MTE, no seu âmbito patronal, o “Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Mulheres e Homens”, que deverá envolver medidas gerais a serem adotados com escala de prioridade; metas, prazos e mecanismos e prazos de aferição de resultados, a cada semestre, ao menos; e planejamento anual com cronograma de sua execução. Dentro do Plano citado, obrigatório para os empregadores alvo da notificação em comento, deverá haver a criação de programas específicos para: o treinamento de empregados a respeito do tema da equidade entre mulheres e homens no mercado de trabalho; a promoção de diversidade e inclusão no ambiente de trabalho; a capacitação e a formação de mulheres para o ingresso, permanência e ascensão no mercado de trabalho em igualdade de condições com os homens. Por fim, nesta temática, as empresas ainda deverão compartilhar cópia do plano de ação com a entidade sindical representante de seus empregados.
A Portaria MTE/3.714/2023 estabeleceu que será criado pela Secretaria de Inspeção do Trabalho o protocolo de fiscalização contra a discriminação salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens, bem como um canal eletrônico específico, disponível no aplicativo da Carteira de Trabalho Digital, para denúncias relacionadas à discriminação salarial e de critérios remuneratórios.
Diante deste pequeno resumo sobre as novidades da Portaria MTE/3.714/2023, é nítido o embate que a mesma promoverá em relação à Lei Geral de Proteção de Dados, posto que na citada Portaria há a previsão, além da ampla divulgação pelo Ministério do Trabalho e Emprego, o dever do empregador de publicizar em seus sítios eletrônicos, em suas redes sociais ou em instrumentos similares, de forma visível, os dados relativos aos salários de cada contratado, envolvendo também o dever de ampla divulgação para seus empregados, trabalhadores e público em geral. Certamente, o Poder Público deverá estabelecer os critérios para harmonizar o choque entre as duas normas em questão, especialmente a necessidade de resguardo de dados e o dito “portal da transparência” no setor público.
Por outro lado, e inegável que a divulgação sobre os salários e remunerações praticadas pelas empresas pode trazer impactos negativo aos negócios das mesmas, podendo causar choque na atração e na manutenção de empregados, e até mesmo a revelações de dados internos pode promover, de forma negativa, o acirramento da concorrência entre as firmas no setor privado.
Certamente, as regras descortinadas neste pequeno resumo, certamente, serão objeto de profundo debate na sociedade brasileira, especialmente pelo pragmatismo a que elas entoam, sendo que o setor produto aguarda ainda mais nitidez para a regulamentação da matéria e inovações trazidas na aplicação da Lei n. 14.611/23.