Há 2 anos, 2 meses e 26 dias, esta colunista fez um artigo-desabafo sobre as violências contra corpos e almas femininas. Na ocasião o grito de dor e revolta era contra as barbáries cometidas contra Mariana Ferrer, vítima de estupro pelo empresário André Aranha, que na ocasião do julgamento, foi mais uma vez desrespeitada, desacreditada e culpabilizada pelo crime desumano que fora vítima.
Hoje, 29 de janeiro de 2023, a sociedade piauiense e todas as mulheres do país sofrem em decorrência de mais uma violência, mais um crime, mais uma morte, mais uma vítima que continua sendo desacreditada e vilipendiada mesmo após a sua morte. A jovem Janaína da Silva, segundo investigações, foi estuprada e morta após calourada na Universidade Federal do Piauí.
Mais uma família (e centenas de milhares de famílias) sente o gosto amargo da insegurança de ser mulher, de estar em qualquer lugar, a qualquer hora, em qualquer companhia, de possui um corpo, uma imagem, uma característica física.
Mais uma vez nos vemos aprisionadas em uma sociedade machista que teima em não ver o óbvio. Que insistem em atrelar o crime de estupro tão somente a ausência de segurança pública ou privada, jogando a responsabilidade ao Estado ou as instituições.
Em verdade, o que mata, violenta, lesiona, e fere todos os dias nós mulheres, é o machismo. A visão construída e reforçada durante séculos de objetificação da mulher. Um ser humano que somente teve tal reconhecimento jurídico, no Brasil, em 1988 com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil e que, posteriormente, ganhou respaldo com o Código Civil de 2002. Até então, as mulheres eram tratadas, com fundamento nos diplomas legais, como coisas, como bens, como propriedade do homem, do detentor de todo e qualquer direito.
É notório que a Constituição Federal de 1988 desempenhou um papel extraordinário em retirar a mulher do limbo e lança-la ao centro do ordenamento jurídico, no entanto, os costumes continuam os mesmos daquela sociedade de outrora, enraizado em valores patriarcais, patrimoniais e machistas. Ainda se crer que as mulheres são seres de segunda categoria e que não podem ou não devem ocupar determinados espaços, escolher os próprios caminhos, trilhar os próprios sonhos, conduzir suas próprias vidas e decidir sobre os próprios corpos. Que audácia! Pensam eles.
Repito, com a mesma angústia de anos atrás, que estamos todas cansadas física e emocionalmente de tantas violências, estupros e mortes. Mas sabemos que só temos a nós mesmas para levantaremos a voz e gritar por justiça e igualdade, na certeza de que nunca nos calarão e que os algozes um dia pagarão por todos os seus crimes.