Você pode estar se perguntando nesse momento: o que os Jogos Olímpicos têm a ver com o Direito Internacional?
Tudo começou lá na Grécia Antiga, por volta de 776 a.C., na cidade olímpica, no sudoeste da Grécia, sendo celebrados periodicamente, de quatro em quatro anos, até 393 a.C. E durante a realização do evento havia o costume de se promover uma trégua entre os Estados participantes, suspendendo-se guerras e conflitos, promovendo-se um período de Paz efêmera.
Não obstante, em 1908 editou-se a Carta Olímpica, norma regulamentadora do Movimento Olímpico, contendo os princípios fundamentais, as regras e preceitos para a realização dos jogos. Mas somente em 1984, criou-se o Comitê Olímpico Internacional – o COI, organização não governamental, com sede na Suíça, criada para reinstituir e organizar os jogos olímpicos, assegurando os valores e atuando como colaborador e mediador entre todos os outros integrantes do movimento, como as Federações Internacionais Esportivas, os Comitês Olímpicos Nacionais, os atletas e corpo técnico, os Comitês Organizadores dos Jogos Olímpicos, além de outras organizações e instituições.
Vale lembrar, também, que a Resolução A/69/L.5 da Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU) reconhece a autonomia esportiva. E esta resolução é considerada um ato internacional de observância obrigatória, ou seja, uma norma de Direito Internacional Público.
Entretanto, ao olhar-se para a arena, percebe-se que nos jogos olímpicos não competem países, mas sim atletas. Todavia, pode acontecer de algum Estado não concordar com as regras da Carta e o seu Comitê Olímpico Nacional ser excluído, impedindo que os atletas desse país possam participar. E é aqui onde outro jogo se desenha: o político.
Diferentemente dos tempos gregos, as olimpíadas são terreno fértil para manifestações políticas. Para Tóquio 2020, o COI (Comitê Olímpico Internacional) recomendou a manutenção da proibição a manifestações políticas no pódio.
A política parece mesmo uma modalidade olímpica importante, o que nos faz recordar dos jogos de Moscou de 1980, no qual nenhum atleta norte-americano participou, dando aso para que em Los Angeles, 1984, não participassem atletas da ex-URSS.
Outro exemplo de forte influência das questões políticas internas e externas no campo olímpico é a situação da África do Sul, no qual fora excluída dos jogos olímpicos desde Tóquio 1964, pela prática do apartheid, somente readmitida nos jogos de Barcelona em 1992.
Uma pausa para essa observação: por 28 anos, o Apartheid influenciou os jogos olímpicos. Ainda, vale recordar que nos jogos de Melbourne, o nado borboleta foi substituído por socos, pontapés, arranhões e manchas de sangue na piscina. Hungria e União Soviética, na época, ensaiavam uma disputa política dentro e fora da piscina, com a invasão da capital húngara, Budapeste.
Outro ponto importante e que se necessita observar é a eleição da cidade para sediar os jogos olímpicos, após a assinatura do “Host City Contract”, e a responsabilização perante o COI: é o Comitê Organizador instituído naquela cidade, e não o Estado, que se reporta ao COI. Porém, vale lembrar que se as exigências não forem cumpridas, pode-se revogar a autorização de sede daquela cidade.
E o arcabouço normativo que reverbera nessa seara não é pequeno, apesar de pairar a grande nuvem da dúvida: são obrigatórias ou não, dentro do plano interno dos países?
Como afirma o professor Wladimyr Camargos, a Convenção Internacional contra o Doping no Esporte, aprovada na Conferência Geral da Unesco, em Paris/2005, seria uma norma típica de Direito Internacional Público, do chamado Direito dos Tratados, fora ratificada internamente no Brasil, por meio do Decreto Presidencial n° 6.653, de 2008, tendo força de lei ordinária em nosso país.
Nesse sentido, o professor chama atenção para o seguinte:
A Assembleia Geral, órgão máximo da ONU, reconhece a Carta Olímpica, verdadeira constituição do Comitê Olímpico Internacional (COI) e de toda a Pirâmide Olímpica. Reconhece porque a Carta Olímpica é uma norma de Direito Internacional Público? Não! A Carta Olímpica é expressão jurídica da autonomia do Movimento Olímpico, é um documento com força de norma obrigatória a todos os integrantes da Pirâmide Olímpica, mas não é uma norma de Direito Internacional. Ademais, é um fecho de abóbada normativo da Lex Sportiva. Portanto, trata-se de uma norma transnacional, pública, mas não estatal, global, mas não um ato internacional propriamente dito.
O Professor ainda defende que é necessário tentar visualizar o direito com menos rótulos, menos apego à territorialidade estrita, começarmos para entender o fenômeno da desterritorialização do direito, do pluralismo jurídico e da transnacionalização sistêmica.
E falaremos mais sobre olimpíadas e direito internacional na próxima coluna! Até a próxima!