Seria tarde demais para dizer adeus?
Eu já estaria totalmente mergulhada no teu ódio?
Eu só queria amar, como assim me fez Deus.
Eu não quero ser troféu para teu pódio.
Eu quero sentir a mão pousar no meu rosto
Leve e macia para me acariciar
Mas tua mão só me traz desgosto
E me ensinou que eu não posso amar
Sinto a mão pesada rasgando a pele
Ardendo como fogo do diabo
O teu olhar só me repele
E só recolho o que sobrou do estrago
Meu destino será padecer no inferno?
Pois não vejo luz em meu caminho
Querendo primavera, só tenho inverno
E num último adeus, desalinho.
Nayara Figueiredo de Negreiros. Adeus.
Stieg Larsson fala-nos, em sua obra, sobre a forma como milhares de mulheres são destratadas, violentadas, espancadas e mortas por uma sociedade misógina, patriarcal, em que a mulher é relegada a papel secundário, pelo simples fato de pertencer ao “sexo frágil”.
Maya Angelou, certa vez, disse-nos que toda vez que uma mulher se defende, sem nem perceber que isso é possível, sem qualquer pretensão, ela defende todas as mulheres.
Simone de Beauvoir lembra-nos de que no dia em que for possível à mulher o amor, não em sua fraqueza, mas em sua força, não para escapar de si mesma, mas para se encontrar, não para se abater, mas para se afirmar. Naquele dia o amor se voltará para ela, assim como para o homem, a fonte de vida e não de perigo mortal. Enquanto isso, o amor representa, em sua forma mais tocante, a maldição que confina a mulher em seu universo feminino, mulher mutilada, insuficiente em si mesma.
Infelizmente, ainda que estejamos falando em 2021, a realidade em relação à violência contra a mulher nada mudou. E a maioria, dorme com o inimigo.
Dados publicados pela ONU MULHERES, afirmam que, mesmo antes da existência da pandemia de Covid-19, a violência doméstica já era uma das maiores violações dos direitos humanos. Só em 2019, 243 MILHÕES de mulheres e meninas (de 15 a 49 anos) em todo o mundo, foram submetidas à violência sexual ou física, por um parceiro íntimo. Após o estouro do Sars-Cov-2, esses números apresentaram expressivo aumento, variando entre 25% a 30% em países como França e Argentina.
É inolvidável, portanto, que a Covid-19 trouxe outra pandemia: a Pandemia Invisível de Violência contra a mulher. Mas, o que se percebe é que esse vírus mortal não está tão invisível assim! Desmascare-se, a cada dia, a face cruel da realidade vivenciada por milhares de mulheres presas em suas próprias casas, com seus algozes.
Só o Brasil, em 2020, recebeu mais de 105 mil denúncias sobre casos de violência contra mulher. E esses casos estão saindo dos bairros afastados da periferia e ganhando espaço nas mansões da classe A, inclusive, tomando espaço irredutível nas redes sociais de artistas famosos. E quando se fala em artistas, pessoas públicas, gera-se, de imediato, a cultura do CANCELAMENTO.
Esse CANCELAMENTO é mais do que necessário para que o agressor, que já escapa ao arrepio da lei, possa, de alguma forma, sofrer uma sanção moral. E aqui, poder-se-ia suscitar vários debates entre DIREITO AO ESQUECIMENTO X DIREITO À PRIVACIDADE X DIREITO DE IMAGEM X DIGINIDADE DA PESSOA HUMANA, pois nossa cultura parece estar voltada sempre para a proteção dos direitos fundamentais do agressor, mas não há uma preocupação real em relação à vítima.
Necessita-se, portanto, mudar-se o olhar sobre os casos de violência contra mulher, apoiando-a nesse momento de fragilidade, de mãos dadas, para amenizar o sofrimento de quem teve que olhar nos olhos de quem a feriu.
E quando tua mãe ligar
Eu capricho no esculacho
Digo que é mimado
Que é cheio de dengo
Mal acostumado
Tem nada no quengo
Deita, vira e dorme rapidinho
Você vai se arrepender de levantar a mão pra mim
Elza Soares